segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Pequenas Grandezas – Miniaturas de Hélio Leites. Rita de Cássia Baduy Pires


Num trabalho relevante e primoroso, a artista plástica Rita de Cássia Baduy Pires apresenta ao público brasileiro um pouco da vida de uma verdadeira “lenda viva”, não só curitibana, mas do Brasil, o “multiartista” e poeta Hélio Leites. Coincidência ou não, eu havia assistido a um documentário na televisão sobre um artista de Curitiba, o qual me chamou muito a atenção, por ser “multiperformático”, e, dias depois, como presente de um amigo, minha esposa recebe em casa um livro sobre ele, um artista chamado Hélio Leites.


Como um extraordinário miniaturista, cujos trabalhos deram nome ao livro, “Pequenas Grandezas”, Hélio Leites poderia até ser denominado, literariamente, parodiando Jonathan Swift, de um liliputiano que cresceu demais. Mas esse artista não é só poeta, miniaturista, “botonista”, fazedor de coisas, Hélio Leites é um “personagem camaleônico”, um “significador de insignificâncias”, como bem o qualificou a artista plástica Marília Diaz ao fazer o difícil “Prelúdio” do livro.


Hélio Leites é um artista de difícil classificação, diante da magnitude, da amplitude e da diversidade da sua produção artística, tanto que o Jornalista Rodrigo Garcia Lopes chegou a criar um inédito neologismo:

“Button-maker-performer-graphic-designer-multimidiaman”.


Já outro jornalista, desta vez Mendanha, também tentou classificá-lo da seguinte forma: “Se tivéssemos de traduzir, em parábola gastronômica, a impressão deixada pela personalidade de Hélio Leites, diríamos estar perante o resultado da seguinte receita: 400 gramas de gênio, tipo Salvador Dali; 300 gramas de loucura saudável; 200 gramas de Budismo Zen, na versão tropical; 100 gramas de franciscanismo ou freudianismo, conforme os gostos, não esquecendo um pau de canela.”


O livro de Rita Pires é resultado de um excelente e magnífico trabalho de pesquisa sobre este extraordinário artista que é Hélio Leites. Para referendar toda a sua produção, Rita Pires trouxe depoimentos de gente de peso, cujas declarações são insuspeitas e inquestionáveis: a poeta curitibana Helena Kolody; o poeta Paulo Leminski (1944-1989); a escritora Adélia Prado; Millôr Fernandes; Domingos Pellegrini; Wilson Bueno e vários outros.


Nada passa despercebido por Hélio Leites. Para ele a arte “deve estar”, segundo seu olhar clínico de artista, e “está” em todo lugar e todas as coisas, principalmente nos rejeitos, na aparente insignificância das pequenas coisas. Primeiro, botões (sim, botões de roupa, hoje tão esquecidos, mas não para Hélio); depois envelopes de carta, “usados” (sempre); caixas de fósforos (usadas e vazias) e os palitos de fósforo, de preferência os queimados, e mais, muito mais. Foi talvez por este motivo que o poeta Paulo Leminski qualificou, de forma precisa, Hélio Leites como o “significador de insignificâncias”.


O escritor Wilson Bueno assim tenta descrevê-lo: “Este Hélio Leites é um cara muito estranho, capaz de pegar na asa da borboleta sem lhe desmanchar o desenho, ainda que, dele, as suas mãos, sejam grandes, quase ríspidas. Daqui imagino o indispensável pássaro que há de morar nelas para que pintem e pinguem, pontículo brilhante, o diminuto olho de uma personagem (ainda) sem rosto e que, de dentro da caixa, logo mais, no centro da cidade, pode que se mexa, e pisque para você, de surpresa, o seu olhículo aceso. Há também mãos e unhas que sendo microscópicas parecem nunca existirem.”


Na reportagem a que assistira anteriormente ao recebimento e à leitura do livro, lembro perfeitamente que Hélio Leites dissera estar fazendo o curso superior de “Artes Plásticas” para que, mais tarde, não o classificassem, depreciativamente ou com outra intenção menos nobre, de ser ele apenas um “artista sem formação”. Ora, pode até ser que haja, e com certeza há, pessoas por aí que se preocupem mais com a “formação” do artista do que com sua produção propriamente dita. Uma mania, embora relevável, mas muito chata que muitos teóricos têm em querer “enquadrar”, “classificar” as coisas como se tudo tivesse que ter alguma “padronização” para poder ser compreensível ou assimilável.


Para mim o artista, seja ele músico, ator, pintor, escultor, escritor, ou outro qualquer de alguma das muitas ramificações das artes, para que ele tenha pleno e integral o seu dom, o seu instinto criador, não basta “estar”, mas ele deve “ser” livre. Íntima e externamente. A mente de um artista não funciona como a de uma pessoa comum (“não-artista”). A liberdade de criação nas artes é polêmica, discutível e muito abrangente, não podendo ser encarada sob o ponto de vista de uma pessoa “normal”, aquela ainda presa à educação convencional, católica, capitalista e consumista, arraigada de conservadorismo, que herdamos de nossos avós e bisavós. Educação ultrapassada, obstinada e muito preocupada apenas com os valores sociais de “estética”, “beleza”, “durabilidade”, “status”, “valor pecuniário”, “tamanho”, “nobreza dos materiais”. Característica do puro materialismo estético.


Muitas vezes, a sociedade se surpreende, diante de um artista e, ingenuamente, sem muito entender, para não perder o chão talvez, já o “rotula” de “brilhante”, “genial”, ou outras expressões completamente desnecessárias, posto que, para mim, são completamente redundantes. Pois um verdadeiro artista é naturalmente criativo, original, genial e, muitas vezes até, simultaneamente genioso. O que se pode discutir, com tranquilidade, a respeito dos artistas, é o “grau” de liberdade que os diferencia. Muitas vezes, equivocadamente, um artista é tachado de “louco”, simplesmente porque produz algo que “os normais” não são capazes de assimilar ou compreender, e logo o “rotulam” para mais ou para menos, superestimando ou subestimando sua produção. Besteira inconsequente. E Hélio Leites é exemplo de um “verdadeiro” artista, é brasileiro e mora em Curitiba.


“Pequenas Grandezas – Miniaturas de Hélio Leites”, da escritora e artista plástica Rita de Cássia Baduy Pires é de 2008, Editora Artes e Textos, Curitiba, PR.rotulam para mais ou para menos, superestimando ou subestimando sua produç