sábado, 24 de outubro de 2009

Contos da Alma. De Alma Welt


“Contos da Alma” é um livro composto por 13 magníficos contos, capazes de transportar o leitor em uma viagem num universo mágico, encantador, repleto de surpresas, que só uma escritora de muito talento e sensibilidade, como Alma Welt, conseguiria.

Em “Contos da Alma”, o tempo narrativo parece não se situar numa época definida. Contos narrados em forma de “memórias”, que poderiam ter se passado há alguns anos, ou décadas, ou há mais de cem anos, não fossem algumas palavras contemporâneas que prendem o leitor ao nosso tempo, como “CD”, “interfone”, um carro “Mercedes”, “e-mail” e “apê”. Talvez seja esta característica de atemporalidade que dê no leitor a impressão de estar lendo um livro “antigo”.

E, de certa forma, qualifico isso, como mais uma riqueza da prosa de Alma Welt, que conduz o leitor numa espécie de “viagem no tempo”, num texto muito rico, com uma linguagem de leve erudição, sem aqueles excessos típicos dos livros de época, como os do Romantismo e do Realismo.

Em “Contos da Alma”, através de narrativas histórico-memorialistas, a personagem “Alma” relembra episódios da sua vida. Essas narrativas possuem fortes características de período literário, principalmente do que os estudiosos denominaram de Romantismo. A personagem “Alma” (creio que a autora também o seja) e as demais mulheres, como “Aline”, do conto homônimo, por exemplo, são belas, física e psicologicamente, bem retratas em suas características e que as qualificariam com figuras femininas idealizadas, típicas do período literário a que me referi.

O “gosto pelo noturno”, também, de forma harmônica com o mistério, como em “A Harpia”, é bem do gosto dos românticos e dos “romantistas” de época. A “função sacralizadora da arte” está bem delineada pela própria personagem “Alma”, artista plástica e poeta. E é através de suas experiências como tal que a maioria das histórias é narrada, e sente-se a relevância da arte tanto para a personagem quanto para o enredo.

Há, também, a “ânsia de glória” para o artista. Aparecendo em quase todos os contos, pois “Alma”, mais que outros personagens, quer se ver reconhecida e admirada. E consegue, fácil e brilhantemente. Há, na personagem “Alma”, e provavelmente na própria autora, o “sentimentalismo” típico. Alma (personagem e autora) é artista e poetisa, e sua poesia traz muito do “seu eu, do seu amor, da sua paixão.” O amor está presente em quase todos os contos, mais que qualquer outro sentimento, manifestando-se em extremos, com fortes e bem descritas cenas de erotismo, aparentemente beirando à libertinagem, mas sempre caracterizando o amor, como algo maior, sobreposto à mera satisfação carnal.

A idéia de memória, lembrança e de retorno ao passado é também típico dos românticos. Tal retorno dá origem a diversas manifestações: como o saudosismo voltado para a própria infância, o passado individual, exemplificado no maravilhoso conto “As férias da infância da Alma” (p. 97).

Numa visão de mundo muito pessoal, interior, os sentimentos da autora Alma Welt, com incidência da provável veracidade dos contos, quando narrados em primeira pessoa (característico da metalinguagem), se fazem como o espaço central da criação. Com uma liberdade plena em seu ato de criar, Alma Welt é uma artista romântica típica, sem dúvida alguma, e não se acanha em expor suas emoções pessoais, em fazer delas a temática sempre retomada em sua obra.

Como um texto memorialista característico, muito influenciado pelo perfil idealista da autora (suponho), a crítica social existente é indireta ou quase inexistente nos contos. Intencional, provavelmente, a supressão de mazelas sociais se dá por motivos estudados. Muitas delas, praticamente irrelevantes ao enredo e à lembrança, exceto num momento quase que isolado, através do personagem do menino “Jonas”, no conto “Meu pequeno vizinho”, p. 23.

O erotismo no mágico imaginário de Alma Welt é quase “velado”. O amor e sexo são retratados de forma sublime, sem o intuito de excitação carnal. Não há vulgaridade no erotismo descrito pela autora. Amor e sexo se confundem em certos momentos, para criar uma aura de erotismo legítimo e puro, sem preconceito ou distorções. A heterossexualidade e a homossexualidade são descritas com tamanha naturalidade e encanto que as vemos como algo singelo, inocente e cotidiano, numa espécie de visão holística, ou paradisíaca.

Estendi-me na resenha do livro “Contos da Alma” por razões pessoais. Um livro como este merece estar à disposição do público leitor nas melhores livrarias. Obra importante de uma escritora madura e consciente do valor da sua produção. Para quem já se encanta com os textos publicados nos “sites”, irá se maravilhar ao ler uma obra inteira deste fenômeno literário chamado “Alma Welt".

O livro “Contos da Alma” foi gentilmente cedido pela autora. Lançado pela Editora Palavras e Gestos EPG Ltda, publicada em 2004.

P.S.: Segundo informações de sua irmã, Lúcia, a grande escritora e poetisa gaúcha Alma Welt faleceu em 20 de janeiro de 2007.

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