sexta-feira, 15 de julho de 2011

Minha mãe não dorme enquanto eu não chegar. Moacyr Scliar


“Palavras. São tudo, para quem escreve. Ou quase tudo. Como a serra, o martelo, a plaina, a madeira, a cola e os pregos para o marceneiro; como a colher, o prumo, os tijolos e a argamassa para o pedreiro; como a fazenda, a linha, a tesoura e a agulha para o alfaiate. Estou falando em instrumentos de trabalho, porque literatura nem sempre parece trabalho. Há uma história (sempre contando histórias, Moacyr Scliar! Sempre contando histórias!) sobre um escritor e seu vizinho. O vizinho olhava o escritor que estava sentado, quieto, no jardim, e perguntava: Descansando, senhor escritor? Ao que o escritor respondia: Não, trabalhando. Daí a pouco o vizinho via o escritor mexendo na terra, cuidando das plantas: Trabalhando? Não, respondia o escritor, descansando. As aparências enganam; enganam até ao próprio escritor.”  (Trecho do livro Minha mãe não dorme enquanto eu não chegar.)
“Moacyr Scliar nasceu em Porto Alegre, em 1937. Era o filho mais velho de um casal de imigrantes judeus da Bessarábia (Europa Oriental). Sua mãe incentivou-o a ler desde pequeno: Monteiro Lobato, Érico Veríssimo e os livros de aventura estavam entre seus preferidos. Mas foi um presente de aniversário que o despertou para a escrita — uma velha máquina de escrever, onde datilografou suas primeiras histórias. Ao ingressar na faculdade de medicina, começou a escrever para o jornal Bisturi. Em 1962, no mesmo ano da formatura na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, publicou seu primeiro livro, Histórias de um médico em formação (contos). Paralelamente à trajetória na saúde pública — que lhe permitiu conhecer o Brasil nas suas profundezas —, construiu uma consolidada carreira de escritor, cujo marco foi o lançamento, em 1968, com grande repercussão da crítica, de O carnaval dos animais (contos).
Autor de mais de oitenta livros, Scliar construiu uma obra rica e vasta, fortemente influenciada pelas experiências de esquerda, pela psicanálise e pela cultura judaica. Sua literatura abrange diversos gêneros, entre ficção, ensaio, crônica e literatura juvenil, com ampla divulgação no Brasil e no exterior, tendo sido traduzida para várias línguas. Seus livros foram adaptados para o cinema, teatro, TV e rádio e receberam várias premiações, entre elas quatro Prêmios Jabuti: em 1988, com O olho enigmático, na categoria contos, crônicas e novelas; em 1993, com Sonhos tropicais, romance; em 2000, com A mulher que escreveu a Bíblia, romance, e em 2009, com Manual da paixão solitária, romance. Também foi agraciado com o Prêmio da Associação Paulista de Críticos de Arte (1980) pelo romance O centauro no jardim, como Casa de las Américas (1989) pelo livro de contos A orelha de Van Gogh e com três Prêmios Açorianos: em 1996, com Dicionário do viajante insólito, crônicas; em 2002, com O imaginário cotidiano, crônicas; e, em 2007, com o ensaio O texto ou a vida uma trajetória literária, na categoria especial.
Pela L&PM Editores, publicou os romances Mês de cães danados (1977), Doutor Miragem (1978), Os voluntários (1979), O exército de um homem só (1980), A guerra no Bom Fim (1981), Max e os felinos (1981), A festa no castelo (1982), O centauro no jardim (1983), Os deuses de Raquel(1983), A estranha nação de Rafael Mendes (1983), Cenas da vida minúscula (1991), O ciclo das águas (1997) e Uma história farroupilha (2004); os livros de crônicas A massagista japonesa (1984), Dicionário do viajante insólito (1995), Minha mãe não dorme enquanto eu não chegar (1996) e Histórias de Porto Alegre (2004); as coletâneas de ensaios A condição judaica (1985) e Do mágico ao social (1987), além dos livros de contos Histórias para (quase) todos os gostos (1998) e Pai e filho,filho e pai (2002), do livro coletivo  Pega pra kaputt! (1978) e de Se eu fosse Rothschild (1993), um conjunto de citações judaicas. Scliar colaborou com diversos órgãos da imprensa com ensaios e crônicas, foi colunista dos jornais Folha de S. Paulo e Zero Hora e proferiu palestras no Brasil e no exterior. Entre 1993 e 1997, foi professor visitante na Brown University e na University of Texas, nos Estados Unidos. Em 2003, foi eleito membro da Academia Brasileira de Letras. Faleceu em Porto Alegre, em 2011, aos 73 anos. Confira entrevista gravada com Moacyr Scliar em 2010
no site www.lpm-webtv.com.br . (p.93/95)
Moacyr Scliar, com seu talento e seu carisma, conseguiu uma façanha que poucos escritores brasileiros conseguem: ser bem recebido pelo público e pela crítica. Quem mais perdeu com a morte de Moacyr Scliar foi a literatura brasileira, que tinha em Moacyr Scliar um dos seus maiores expoentes. Sua cadeira na Academia Brasileira de Letras foi uma das poucas em que o titular fez por merecer. Uma obra conhecida e respeitada mundialmente.
 



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