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quarta-feira, 26 de setembro de 2012

O Nome do Vento. Patrick Rothfuss

Por Will Duarte. (de O livreiro maluco)  
 
“Já resgatei princesas de reis adormecidos em sepulcros. Incendiei a cidade de Trebon. Passei a noite com Feluriana e saí com minha sanidade e minha vida. Fui expulso da Universidade com menos idade do que a maioria das pessoas consegue ingressar. Caminhei à luz do luar por trilhas de que outros temem falar durante o dia. Conversei com deuses, amei mulheres e escrevi canções que fazem os menestréis chorarem. Vocês devem ter ouvido falar de mim.”

Demorei semanas para escrever essa resenha. Simplesmente não conseguia escolher que palavras usar para mostrar o quão fantástico é O Nome do Vento. Tal obra irá deleitar qualquer fã da literatura fantástica e claro, também aqueles que não o são. Patrick Rothfuss criou um novo e belíssimo mundo fantástico, com novos idiomas, seu próprio sistema monetário e povoado por mitos e seres fabulosos, onde nenhum é tão interessante quando o próprio protagonista da obra.

“Meu primeiro mentor se chamava de E’lir, porque eu era inteligente e sabia disso. Minha primeira amada de verdade me chamava de Duleitor, porque gostava desse som. Já fui chamado de Umbroso, Dedo-Leve e Seis-Cordas. Fui chamado de Kvothe, o Arcano; e Kvothe, o Matador do Rei. Mereci esses nomes. Comprei e paguei por eles."

Kvothe, esse é o seu verdadeiro nome, mas apenas um dos muitos pelos quais ele ficou conhecido. Aos poucos a vida do personagem vai sendo revelada, a partir de sua infância junto com seus pais em uma trupe itinerante, chamada os Edena Ruh. E é ao conhecermos sua infância que entendemos o motivo do “mito Kvothe” nascer. Tudo começa com o encontro de sua trupe com um misterioso e perigoso grupo, que até então era considerado apenas como mais uma lenda, uma história para assustar crianças. Tudo começa no encontro de Kvothe com o Chandriano.

Tentei adiantar o mínimo possível sobre o enredo do livro, pois como aconteceu comigo quero que vocês possam descobrir todos os detalhes sozinhos e se surpreender com eles. O Nome do Vento não é um livro para ser devorado, que se possa ler em um ou dois dias, mas é um livro que deve ser apreciado, por vezes estudado.

Por diversos momentos cheguei a me emocionar com a estória de Kvothe, que apesar de incrível também é  triste. A narrativa adotada por Patrick é bastante descritiva, mas o modo como a autor decidiu empregá-la torna impossível que o leitor se canse com a mesma. O mundo criado por ele é fantástico, único e incrivelmente interessante, assim como Kvothe, um dos personagens mais fantásticos da literatura que tive o prazer de conhecer.

Não poderia deixar de citar o incrível trabalho feito pela Editora Sextante (Após um acordo entre Sextante e Arqueiro o livro passou a pertencer a segunda editora.) na capa e diagramação do livro. Começo falando sobre a lindíssima capa pelo artista Marc Simonetti, o mesmo artista responsável pelas capas da série As Crônicas de Gelo e Fogo no Brasil. E a diagramação que, apesar de simples, cai como uma luva para o livro, com suas páginas amareladas e a separação entre os capítulos. Aproveito para destacar também a ótima tradução de Vera Ribeiro.

O Nome do Vento é o primeiro livro da trilogia A Crônica do Matador do Rei, e serve apenas como um aperitivo do que estar por vir. Ao terminar de ler a obra, completamente maravilhado, tive certeza de uma coisa. Esse livro serve apenas como uma introdução para uma estória muito maior é fantástica que, sem dúvida, encontraremos nos outros dois volumes da série.

Patrick Rothfuss

terça-feira, 31 de julho de 2012

Os Trabalhadores do Mar. Victor Hugo

Por Darcy Barcelos. (do Livros pela Casa)


Os Trabalhadores do Mar é o terceiro livro que li do bardo Victor Hugo e cada vez fico mais fascinado por ele. Em minha opinião nenhum escritor que eu tenha lido consegue descrever a alma humana de uma forma tão clara e comovente quanto ele. Não é um livro tão complexo como o maravilhoso 'Os Miseráveis' (meu primeiro contato com sua obra), mas acredito que um pouco superior ao 'Corcunda de Notre Dame', (também sensacional, meu segundo contato). Trata-se de uma história de perseverança e amor em que os sentimentos, magistralmente descritos, fascinam por seu grau de intensidade.

Acompanhe a incrível história de superação de Gilliatt numa jornada incrível contra os elementos da natureza (descritos por metáforas fascinantes) em favor do seu amor pela filha de um construtor náutico.

Enfim, Victor Hugo é um escritor para pessoas sensíveis que gostam de se emocionar.


Victor Hugo

segunda-feira, 16 de julho de 2012

Les Femmes. Liberatore

Livro com alguns dos melhores trabalhos do artista plástico Gaetano Tanino Liberatore lançado em 2011, pela Editora Drugstore.  Liberatore nasceu em 12 de abril de 1953. É um artista italiano, desenhista e ilustrador, que começou com desenhos de quadrinhos e desenvolveu um estilo próprio, cheio de detalhes, muito polêmico e repleto de erotismo. Em "Les Femmes", com trabalhos de diversas técnicas, desde aquarela, desenho, e outros, Liberatore faz uma grande homenagem às mulheres e, claro, o que nelas há de abundante e que enlouquece os homens. Um livro de arte no mais puro sentido que não precisou de texto para bons entendedores. Divirta-se com as imagens publicáveis a seguir postadas, extraídas do livro. (E, por favor, clique nas imagens para ampliá-las



Liberatore (1953)

segunda-feira, 19 de março de 2012

O apanhador no campo de centeio. J. D. Salinger


"O Livro Que Inventou Uma Geração

por Marco Antônio Bart – email - Novembro/1999
O que faz com que um livro narrando acontecimentos quase banais, ocorridos com um adolescente que não tem nada de extraordinário se transforme na mais acurada e sensível crônica da juventude do século? Só os espertos que chegaram a ler O Apanhador no Campo de Centeio, do escritor americano J.D. Salinger, é que podem dizer com certeza. Prestes a completar 47 anos de publicação - surgiu em 195 -, antes mesmo dos pais da maioria de vocês nascerem - a novela de Salinger é não só uma das mais marcantes obras da literatura norte-americana contemporânea, como é também um marco na longa estrada que os jovens trilharam (e ainda trilham) para provar que têm direito a uma voz e uma visão de mundo próprias.

É bastante possível que você nunca tenha lido O Apanhador no Campo de Centeio. No entanto, se você tem um mínimo de "antenidade" com o mundo que o cerca, muito provavelmente já leu ou ouviu alguma alusão ao livro no cinema, em jornal, revistas ou em outros livros. O fato é que este singelo romance de 1951 virou lenda ao longo dos anos, e fez de seu autor, Jerome David Salinger, um dos maiores mistérios da história recente da literatura. A pequena revolução que O Apanhador no Campo de Centeio causou no comportamento da juventude americana - e por tabela, no comportamento da juventude do mundo todo - ecooa até hoje, fazendo parte da cultura da segunda metade de nosso corrente século.

O Apanhador no Campo de Centeio narra um fim-de-semana na vida de Holden Caulfield, jovem de 17 anos vindo de uma família abastada de Nova York. Holden, estudante de um pomposo internato para rapazes, volta para casa mais cedo no inverno depois de ter levado bomba coletiva em quase todas as matérias. Na volta para casa, ao se preparar para enfrentar o inevitável esporro da família, Holden vai refletindo sobre tudo o que (pouco) viveu, repassa sua peculiar visão de mundo e tenta enxergar alguma diretriz para seu futuro. Antes de se defrontar com os pais, procura algumas pessoas importantes para si (um professor, uma antiga namorada, sua irmãzinha) e tenta lhes explicar a confusão que passa por sua cabeça.

E é só isso aí. Não há nada de mais trágico, ou dramático, na história; é só um adolescente voltando para casa. A grande magia de O Apanhador no Campo de Centeio é justamente esta: ser uma história de e para adolescentes, e não meramente um livro "recomendado para leitores em idade escolar". Foi a primeira vez na literatura americana (ou mesmo na mundial) que o universo próprio dos jovens foi estudado a fundo e exposto de maneira absolutamente natural, sem nenhuma pretensão ou didatismo. As idéias, conceitos, bobeiras, burrices, enfim, toda a loucura de ser jovem, nunca tinham sido traduzidos de uma maneira tão profundamente sintonizada com a realidade.

Vale um aparte aqui: antes de O Apanhador no Campo de Centeio, simplesmente não existia esta coisa que há hoje de "cultura jovem". Pode ser difícil de acreditar, mas há meros 50 anos os jovens (e sua maneira de pensar, suas idéias próprias e suas aspirações) não eram levados a sério pelos adultos de forma alguma. Ser jovem, nos anos pré-Elvis Presley, era apenas estar em um estágio irritante entre criança e o "homem feito", uma fase que devia passar o mais rápido possível e sem maiores dores. O que não quer dizer que os jovens não tivessem seus anseios e preocupações - que não eram infantis nem adultas - mas que eram ignoradas pelos mais velhos. O Apanhador no Campo de Centeio, com seu relato sem retoques de tudo aquilo que realmente se passa na mente de um adolescente, ajudou a tornar a sociedade mais atenta à barra (às vezes, pesada) que é ser jovem.

E o talento sem tamanho de J. D. Salinger é um dos maiores responsáveis pelo status cult do livro até hoje. Apesar de já ter passado longe da adolescência quando escreveu a obra (estava com 32 anos quando o livro saiu), o autor penetrou de forma admirável na maneira própria que os jovens têm para se expressar. O livro marcou época por seu uso ousado de gírias,  expressões e referências "chulas" - que andavam na boca da rapaziada da época. Salinger colocou em Holden Caulfield, de forma realista e convincente, tudo o que se passa na cabeça de um rapaz de 17 anos: as preocupações com o futuro, a incerteza de todo o mundo que passa por esta fase, as garotas (claro!)... Tudo de uma maneira que nunca havia sido vista antes, com liberdade de estilo, inteligência e um raro sentimento de proximidade com o universo jovem.

O mesmo sucesso que consagrou de vez o talento de Salinger (que já vinha, desde os anos 40, publicando contos em revistas) foi sem dúvida o responsável pelo rumo inesperado que sua carreira (e sua vida) tomou desde então. O Apanhador, seu primeiro romance (e único volume de material inédito) tornou-se uma coqueluche instantânea entre os jovens americanos, enlouquecidos ao finalmente conseguirem se identificar de forma tão perfeita com um herói de literatura. Engraçado, comovente e forte, o livro é literatura de primeira: leve e ágil, próprio para gente jovem (que ainda não "tem paciência com esta coisa de literatura"). Mas com estilo totalmente próprio e marcante.

Depois de vender 15 milhões de exemplares e virar uma celebridade mundial, Salinger - notoriamente tímido e agressivamente modesto em relação a seu talento - primeiro isolou-se em uma casa no topo de uma montanha, em uma cidadezinha de mil habitantes. Depois foi diminuindo o ritmo de produção (publicou seu último conto, Hapworth 16, 1924, em 1965, na revista The New Yorker) e afinal cortou qualquer contato com a mídia. Não concede entrevistas, não se deixa fotografar e nunca permitiu que nenhum dos seus livros fosse adaptado para o cinema (assim como o próprio Holden Caulfield, Salinger odeia cinema). Em dezembro de 1997, o escritor, do alto de seus 78 anos, autorizou afinal o lançamento de seu quinto livro (justamente a publicação em capa dura de Hapworth 16, 1924), o primeiro em 34 anos. (Parece o My Bloody Valentine.)

A mística sobre o autor de O Apanhador no Campo de Centeio não se sobrepôs ao impacto da obra em si. Holden Caulfield e suas desventuras se tornaram precursores do mito da juventude rebelde - Holden contesta os mais velhos e não quer se tornar como eles, a quem considera farsantes. Toda a sua luta é para preservar os valores que ele acha verdadeiros e sinceros. Pode-se dizer que a figura de James Dean, o rebelde sem causa, é filhote da cruzada de Holden por sua integridade. O livro foi citado por incontáveis bocas célebres ao longo dos anos, em filmes e outros livros. Uma das notas tristes na "biografia" da obra é que o livro teria inspirado o maluco Mark Chapman a cometer o ato que o tornou macabramente famoso - assassinar John Lennon, em 1980. Mas nem por isto O Apanhador no Campo de Centeio deixou de ser um dos livros indispensáveis (talvez o único realmente indispensável) na formação de qualquer jovem que deseja compreender melhor a si mesmo, e como o mundo o enxerga - e a seus colegas. Eu mesmo li duas vezes: a primeira aos 12 anos, a segunda - no original em inglês, mais engraçado ainda - aos 19. E ainda vou encarar uma terceira, assim que achar um exemplar em algum sebo: o livro, editado pela Editora do Autor, anda bastante arredio. Mas quem achar, agarre na hora. É a fonte da eterna juventude.


O Apanhador no Campo de Centeio e cia...

- Além da música Who Wrote Holden Caulfield? (Kerplunk!, de 1992), o Green Day faz referências a Holden Caulfield nos cinco álbuns da banda.

- A letra de In Hiding, do Pearl Jam, fala sobre tentar achar a casa de Salinger. Eddie Vedder disse ao NME que, no fundo, é uma metáfora sobre tentar encontrar a casa de Deus, "como se Ele fosse um recluso; você encontra a casa Dele, abre Sua caixa de correspondência e descobre que está cheia de junk mail".

- Quando perguntaram a Mark Chapman por que ele matara John Lennon, o perturado-mental-ou-pau-mandado-da-CIA disse: "Leia O Apanhador no Campo de Centeio e você descobrirá porque o fiz. Esse livro é meu argumento".

- Em uma referência a Chapman, o filme Teoria da Conspiração traz Mel Gibson no papel de um lunático que compra todas as cópias de O Apanhador... que consegue encontrar, sem nunca ter lido o livro.

- A Disney tem um projeto de produzir uma versão animada de O Apanhador... com um pastor alemão como Holden Caulfield... (que Deus nos livre e o santo Salinger proiba todo esse lixo!).

- A banda americana The Caulfields.

- A gravadora indie Caulfield Records (PO Box 84323 Lincoln, NE 68501 USA).

- A cantora Lisa Loeb fundou a banda Nine Stories, título de um dos livros de Salinger.

- Bill Halley and his Comets gravaram a homenagem a Salinger Rocking Through The Rye (1958). "

Trecho do livro: “Seja lá como for, fico imaginando uma porção de garotinhos bricando de alguma coisa num baita campo de centeio e tudo. Milhares de garotinhos, e ninguém por perto – quer dizer, ninguém grande – a não ser eu. E eu fico na beirada de um precipício maluco. Sabe o que eu tenho de fazer? Tenho que agarrar todo mundo que vai cair no abismo. Quer dizer, se um deles começar a correr sem olhar onde está indo, eu tenho que aparecer de algum canto e agarrar o garoto. Só isso que ia fazer o dia todo. Ia ser só o apanhador no campo de centeio e tudo.” (pág. 168)
 



segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

A Revolução dos Bichos. George Orwell

"A "Revolução dos Bichos" (Animal Farm) (ou o "O Triunfo dos Porcos") é o segundo livro mais famoso de George Orwell, perdendo somente para sua obra prima: 1984. A obra relata a história de um grupo de animais que realizam uma revolução na fazenda onde vivem e tomam o poder transformando seu grupo numa sociedade igualitária. Mas os porcos, os animais mais inteligentes, tomam o poder e reiniciam os tempos de exploração.

A obra foi baseada e reproduzida a partir da revolução russa de 1917 . Existe o Lênin que esta na figura do porco Major, Existe o Trotsky representado pelo porco Bola de Neve e o famoso e tirano Stalin idealizado pelo porco Napoleão. No início existe uma sociedade capitalista: os que produzem (os animais) possuem menos do que aqueles que não produzem (os humanos). O Porco Major tem um sonho sobre uma sociedade sem diferenças e sofrimentos. Ele morre, mas alguns porcos realizam o tal sonho e criam uma nova ideologia (Animalismo) semelhante ao Socialismo. Entretanto o Porco Major objetivando mais poder, expulsa Bola de Neve e insere um Totalitarismo na fazenda.

A fábula gira em torno da crítica ao sistema socialista e ao governo de Stalin que traiu a revolução soviética. Essa história foi escrita durante a Segunda Guerra Mundial e o Geoge Orwell era anarquista. Odiava qualquer tipo de totalitarismo ou poder. Foi devido a isso que a história possui esse caráter critico da situação miserável da população soviética durante o governo desse ditador e durante a revolução. Recomendo que antes de ler, que você estude ou olhe como ocorreu, para relembrar, a Revolução Russa.

A história possui uma atmosfera sempre negativa. Seu desenvolvimento mostra que apesar de ocorrer diversas mudanças, a vida naquela fazenda não vai melhorar. O Burro sempre possui a razão de dizer que a vida sempre foi ruim e nunca haverá progresso. Isso identifica muito claramente a situação do camponês ou do operário durante esse período. Além disso, a falta de capacidade de expressão ou talvez até a permissão de criticar impede que os (trabalhadores) animais possam opinar ou derrubar esse poder.

Portanto recomendo a leitura, pois, além de ser uma obra muito bem feita, é curta e pode ser encontrada em qualquer livraria. Se quiser baixe no PDL." (Fonte: Bibliocracia)
 
Assista ao filme também: Animal Farm (1999)


quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Alegria Breve. Vergílio Ferreira


Eis mais um livro que li num só fôlego. Eu o li há muitos anos, durante meu tempo de faculdade, quando cursava concomitantemente Letras e Direito. Um livro que me marcou e que eu não esqueci. Só realmente obras como esta que podem ser enquadradas como Literatura Universal. Temas que extrapolam limites do idioma, e que podem atingir milhões de leitores. A seguir uma resenha que achei e que vale a pena ler, corroborando meus pensamentos.

"Uma grande obra de um dos maiores autores portugueses, cujo valor nem sempre tem sido devidamente reconhecido. Uma escrita "melódica", em que os sons e os silêncios são enaltecidos. "Alegria Breve" é a vida, e também a morte, o envelhecimento, a solidão, as experiências passadas, o que podia ter sido mas não chegou a ser, o corpo e a alma, o mundo que nunca foi nosso, apenas emprestado e retirado a qualquer instante." (Fonte: Ousar Ler.)

"Estou velho. Há o sol e a neve e a aldeia deserta. O meu corpo o sabe, na humildade do seu cansaço, do seu fim. Alegria breve, este meu sabê-lo, esta posse de todo o milagre de eu ser e a deposição disso para o estrume da terra. Sento-me ao sol, aqueço. Estou só, terrivelmente povoado de mim. Valeu a pena viver? Matei a curiosidade, vim ver como isto era, valeu a pena. É engraçada a vida e a morte. Tem a sua piada, oh, se tem. Vim saber como isto era e soube coisas fantásticas. Vi a luz, a terra, os animais. Conheci o meu corpo em que apareci. É curioso um corpo. tem mãos, pés, nove buracos. Meteram-me nele, nunca mais o pude despir, como um cão à cor do pêlo que lhe calhou. É um corpo grande, um metro e oitenta e tal. É o meu corpo. Calhou-me. Movo as mãos, os pés, e é como se fossem meus e não fossem. É extraordinário, fantástico, um corpo. Com ele e nele tomei posse e conhecimento de coisas espantosas. Não seria uma pena não ter nascido? Ficava sem saber. Dirás tu: de que te serve se amanhã já não sabes? É certo. Mas agora sei. De que servem os prazeres que já tive e nunca mais poderei ter? Não servem de nada, serviram."
Vergílio Ferreira